2020-07-03
Diretiva (UE) 2019/1023 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019: Regimes de Recuperação e Insolvência dos Estados-Membros

 

por: Rita Silva Dias & André Ferreira Cardoso

Publicada no dia 26 de junho de 2019, e por forma a mitigar as diferenças entre os diversos regimes de recuperação e insolvência dos Estados-Membros, vem a Diretiva (UE) 2019/1023 do Parlamento Europeu e do Conselho de 20 de junho de 2019 estabelecer regras relativas “a) Aos regimes de reestruturação preventiva à disposição dos devedores com dificuldades financeiras, caso exista uma probabilidade de insolvência, destinados a evitar a insolvência e a garantir a viabilidade do devedor; b) Aos processos conducentes a um perdão das dívidas contraídas por empresários insolventes; e c) Às medidas destinadas a aumentar a eficiência dos processos relativos à reestruturação, à insolvência e ao perdão de dívidas.” (artigo 1.º, n.º1).


Assente numa perspetiva preventiva, por preconizar a manutenção dos postos de trabalho mantendo a actividade empresarial, quebrando assim com a abordagem clássica de que o direito da insolvência visa a liquidação de uma empresa em situação económica difícil, a Diretiva vem desenhar mecanismos que os Estados-Membros deverão observar para maior eficácia e redução da duração dos processos relativos à reestruturação, à insolvência e ao perdão de dívidas, procurando harmonizar o mercado interno de cada um daqueles e da própria União.


De fora da aplicação da diretiva ficarão, a par dos organismos públicos nos termos do direito nacional dos Estados-Membros, os devedores que sejam as empresas de seguros e de resseguros, as instituições de crédito, tal como definidas no artigo 4.º, n.º 1, ponto 1, do Regulamento (UE) n.º 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, as empresas de investimento e organismos de investimento coletivo, tal como definidos no artigo 4.º, n.º 1, pontos 2 e 7, do Regulamento (UE) n.º 575/2013, as contrapartes centrais, tal como definidas no artigo 2.º, ponto 1, do Regulamento (UE) n.º 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, as centrais de valores mobiliários, tal como definidas no artigo 2.º, n.º 1, ponto 1, do Regulamento (UE) n.º 909/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho (10) e outras instituições financeiras e entidades enumeradas no artigo 1.º, n.º 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho.


Quanto às pessoas singulares insolventes que não sejam empresários, determina a referida Diretiva que cada Estado-Membro mantém a prorrogativa de lhes aplicar os processos conducentes a um perdão das dívidas, assim como consente a mesma Diretiva que a cada Estado-Membro se reconheça da possibilidade de restringir os regimes de reestruturação preventiva à disposição dos devedores com dificuldades financeiras apenas a pessoas colectivas.


Busca a Diretiva que cada Estado-Membro possa criar processos de restruturação preventiva, permitindo que os devedores mantenham o controlo total ou pelo menos parcial dos seus ativos e do exercício corrente da sua atividade e garantindo-lhes a suspensão das medidas de execução para apoiar as negociações do plano, suspensão essa abrangendo todos os tipos de créditos, incluindo os créditos garantidos e os créditos preferenciais.


Especial enfoque procura dar o diploma aos direitos dos trabalhadores, determinando que, por razão alguma, o direito à negociação coletiva e à ação sindical, o direito à informação e à consulta em conformidade com a Diretiva 2002/14/CE e com a Diretiva 2009/38/CE e os direitos garantidos pelas Diretivas 98/59/CE, 2001/23/CE e 2008/94/CE sejam afectados pelo regime de reestruturação preventiva, mais determinando a aprovação por parte dos trabalhadores das medidas que impliquem alterar a organização do trabalho ou as relações contratuais.


Aos Estados-Membros determina-se que assegurem aos membros das autoridades judiciais e administrativas que trabalham com processos relativos à reestruturação, à insolvência e ao perdão de dívidas a formação adequada e os conhecimentos especializados necessários às suas responsabilidades, mandando criar mecanismos de supervisão e regulação à actividade destes.


Em suma, procura-se que os Estados-Membros assegurem, quer aos devedores, quer aos credores destes, mecanismos claros que permitam detetar e responder às circunstâncias susceptiveis de dar origem a uma insolvência, o que se espelha nos títulos II, III e IV do referido diploma*, determinando que, até 17/07/2021, possam aqueles publicar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à diretiva, com exceção das disposições referentes à utilização de meios de comunicação eletrónicos, que devem ser adotadas e publicadas até 17 de julho de 2024, e das disposições referentes à utilização de meios de comunicação eletrónicos para apresentação de contestações e interposição de recursos que devem ser adotadas e publicadas até 17 de julho de 2026.


Os Estados-Membros que tenham particular dificuldade na aplicação da diretiva podem beneficiar de uma prorrogação máxima de um ano do prazo de transposição, notificando a Comissão da necessidade de recorrer a esta faculdade até 17 de janeiro de 2021.

 

 

* Os títulos II, (http://abclegal.com.pt/comunicacao/213) III (http://abclegal.com.pt/comunicacao/217) e IV serão abordados autonomamente nas subsequentes notas informativas da ABC LEGAL.

 

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